Primeiro, as manifestações, em que pese um viés, têm se mostrado multifacetadas, contendo pobres e ricos, homens e mulheres. Resumir qualquer ato como elitista ou composto exclusivamente por pobres só serve, na verdade, para enquadrar de modo conveniente a um dos lados o modo de processamento da disputa política, pintando o quadrado como redondo.
Segundo, a divisão revela um preconceito contra os pobres. Não é porque ele recebe algum tipo de ajuda das organizações que promovem o ato e se propõem a ser suas representantes que eles não têm a consciência sobre o que está em jogo. No passado não muito distante, só era considerado portador de uma percepção sobre a política quem possuía determinada renda e apresentava título acadêmico. Apesar deste tempo ter ficado no passado, o preconceito permanece.
O inverso disso também é verdadeiro. O fato de não ter recebido ajuda direta de uma determinada organização não significa que quem esteve ali não esteja atravessado por interesses materiais. Assim como a ajuda da Cut não é gratuita, a que vem sendo dada pelos conselhos médicos também não é. A participação política de ambas, defendendo os projetos que acreditam, está alicerçada em direitos comuns.
A participação política dos pobres não pode passar por esse processo de criminalização. Se ele depende do ônibus de uma organização para levá-lo até o protesto, está da mesma forma caminhando com os seus pés e motivado pela sua percepção sobre o que é certo e errado.
A não ser que o mobilizador do argumento seja contra a participação dos pobres. Então, que defenda abertamente.

Daniel Menezes