Não dá pra engolir tudo
AUGUSTO HELENO PEREIRA, 68, general da reserva do Exército, é
diretor de comunicação e educação corporativa do COB – Comitê Olímpico
do Brasil. Foi comandante da Missão das Nações Unidas no Haiti (2004 e
2005)
Jornalistas odeiam censura e cerceamento à liberdade de expressão,
mas alguns se assustam quando chefes militares da ativa fazem colocações
verdadeiras e oportunas sobre a conjuntura nacional.
Vale recordar que os profissionais das três Forças se dedicam,
durante a carreira, ao estudo de problemas brasileiros e à avaliação da
conjuntura internacional.
Além da Universidade Militar (quatro anos), cursam, como capitães, a
Escola de Aperfeiçoamento (um ano); depois, mediante concurso, já
oficiais superiores, a Escola de Comando e Estado Maior (dois anos); e,
por último, durante um ano, um pós-doutorado, na área de política e
estratégia.
Saem da teoria e vivem os problemas “in loco”. Residem,
invariavelmente, nos lugares mais inóspitos do território nacional,
particularmente na Amazônia, onde, quase sempre, só os “milicos” se
fazem presentes. Conhecem o país como poucos. Pagam impostos e são
obrigados a votar.
Importante notar que a incapacidade de boa parte dos governantes
lhes custa caro. Por conta disso, distribuem água no Nordeste; constroem
e reparam estradas e pontes; ocupam comunidades para reprimir o crime;
monitoram, sozinhos, boa parte das imensas fronteiras; retomam invasões
ilegais; cuidam de inúmeras comunidades indígenas abandonadas; cobrem
deficiências do sistema de saúde; gerenciam catástrofes; combatem a
dengue, entre outros.
Ou seja, os militares cumprem qualquer missão, além de suas tarefas
constitucionais. Ainda assim, são mal remunerados e dispõem de
orçamento destroçado. Por motivos óbvios, não podem se organizar em
sindicatos, nem fazer greves.
Os chefes militares exigem de seus comandados dedicação integral,
até em fins de semana e feriados, sem qualquer remuneração extra. Devem,
portanto, mantê-los inteirados da situação.
O general de Exército Antônio Hamilton Martins Mourão construiu sua
carreira pautado pela lealdade, retidão e respeito aos subordinados.
Soldado exemplar, líder inconteste, nunca se permitiu mentir, blefar,
caluniar ou se omitir.
Desafio que apontem qualquer inverdade nas palavras que Mourão
dirigiu a outros militares, em atividade interna. Um dos slides de sua
palestra informava que “a maioria dos políticos de hoje parecem privados
de atributos intelectuais próprios e de ideologias, enquanto dominam a
técnica de apresentar grandes ilusões que levam os eleitores a achar que
aquelas são as reais necessidades da sociedade”.
O comandante do Exército, general Eduardo Villas Bôas, julgou que
esses são assuntos institucionais que cabiam a ele, comandante, abordar.
Pediu a transferência de Mourão do Comando Militar do Sul para outra
função, na secretaria de Finanças, igualmente nobre, compatível com o
posto que ocupa. Assunto encerrado. Princípios de hierarquia e
disciplina. Simples assim.
Fica a dica: autoridades civis, que conduzem os destinos do Brasil
(aquelas que enfiarem a carapuça), se querem evitar esse tipo de
desconforto, comportem-se com um mínimo de dignidade, competência e
probidade, evitando tantas mentiras, escândalos e roubalheiras. Não dá
para engolir tudo.
Esquerdopatas, fiquem calmos. São outros tempos. As Forças Armadas
seguirão apolíticas e apartidárias, mas, pelo que levam na alma, jamais
serão bolivarianas.
Os castrenses não pensam em tomar o poder, nem pretendem violar as
instituições do regime democrático em que vivemos, ainda que pleno de
imperfeições.
No entanto, não somos robôs descerebrados e insensíveis. Guardamos,
tanto quanto vocês, o direito e o dever de espernear contra tantos
desmandos e falcatruas.
Brasil, acima de tudo!
*Na íntegra, via Folha de São Paulo (16/11/2015).
Nenhum comentário:
Postar um comentário