
Deputados federais declaram guardar fortunas "debaixo do colchão"
Você guardaria R$ 10 mil em sua casa? Se acha pouco, que tal R$ 100 mil sob o colchão? Ainda considera pouco? O que acharia de dormir sobre R$ 1 milhão? Talvez você não cometa essa imprudência. Mas 112 dos 513 deputados federais que estão concorrendo a algum mandato popular nestas eleições declararam à Justiça Eleitoral manter sob sua guarda em espécie quantias que variam de míseros R$ 13,02 a até R$ 1,3 milhão, que somam R$ 17.021.275, 36.
Campeão da prática, o deputado federal Aníbal Ferreira Gomes (PMDB-CE) informou ter R$ 1,3 milhão em dinheiro – o equivalente a 19% de seu patrimônio declarado de R$ 6,8 milhões. Em segundo lugar no ranking está o deputado federal José Chaves (PTB-PE): informa ter R$ 1.076.399,50 em espécie, a título de “adiantamento para aumento de capital na NTA Administração e Participações Ltda”, além de outros R$ 30 mil em dinheiro, que correspondem a 14,15% do seu patrimônio declarado de R$ 7,40 milhões. O deputado federal Alexandre Cardoso (PSB-RJ) declarou ter R$ 1 milhão em espécie, 30,75% de seu patrimônio informado de R$ 3,251 milhões. Da mesma forma, Renato Amary (PSDB-SP) e Bonifácio Andrada (PSDB-MG) informaram manter, nessa ordem, R$ 990 mil e R$ 850 mil em dinheiro fora do banco. O montante corresponde a 77,2% dos bens de Amary, que somam R$ 1,28 milhão e a 8,7% do patrimônio assinalado por Andrada, de R$ 9,69 milhões.
Os valores em espécie declarados pelos 112 deputados federais variam enormememente. O menor foi informado por Rodovalho (PP-DF): R$ 13,02. Vinte e oito desses parlamentares que declararam os menores volumes em dinheiro vivo mantêm até R$ 27 mil em espécie, como é o caso de Paulo Bauer (PSDB-SC). No extremo oposto, os 28 que guardam as maiores somas em dinheiro, chegam a acumular entre R$ 175 mil em espécie, como é o caso do deputado federal Carlos Melles (DEM-MG), e R$ 1,3 milhão, como faz Aníbal Gomes. São Paulo, seguido por Minas Gerais – estados que têm as maiores bancadas de respectivamente 70 e 53 deputados federais – apresentam o maior número de parlamentares cheios de dinheiro em casa, respectivamente 21 e 16. Um terço da bancada de 30 do Paraná e oito dos 22 representantes do Ceará adotam o expediente. No Rio, há sete na bancada de 46 que informam somas em dinheiro em sua declaração.
Irracional
Exclusivamente sob a perspectiva das finanças pessoais, consultores ouvidos pelo Estado de Minas são unânimes: manter dinheiro vivo em casa não é racional. Além de colocar os moradores da casa sob a insegurança e a mira de assaltantes, a moeda deixa de ser remunerada por uma gama de investimentos existentes no mercado.
Em uma rápida projeção, Paulo Vieira, professor de economia e consultor de finanças pessoais, demonstra que R$ 17 milhões aplicados em um fundo conservador de investimento, de 1% ao mês, ao fim de um ano, com a capitalização, renderia juros de cerca de R$ 2 milhões. “Além disso, há um processo inflacionário, ainda que baixo, mas existe. Se você começar o ano com R$ 100 mil sob o colchão, em dezembro poderá comprar apenas cerca de R$ 95 mil”, considera. “Tanto dinheiro em casa levanta indagações, pois as desvantagens com a prática são muito grandes”, acrescenta.
Ao ter a “penúria” confrontada com a sua declaração e ser informado de que lidera o ranking do dinheiro em espécie da Câmara, Aníbal disse: “Graças a Deus. Ele foi generoso comigo. Mas na realidade quem faz o meu imposto é o meu contador. Vou vendendo, digo o que adquiri e ele vai fazendo”. O parlamentar não quis informar onde guarda o dinheiro em sua casa. Indagado se seria sob o colchão, ele disparou: “Onde está é segredo de estado. É uma questão de segurança. Mas bote como quiser. Não vai perder a minha amizade não”.
Já o deputado federal Bonifácio Andrada (PSDB) justifica: “Guardei o dinheiro em casa porque tenho medo de o banco quebrar. Gosto de ter é debaixo do colchão”. Segundo ele, manter o dinheiro vivo à mão é vantajoso. Depois de relembrar o governo Collor e o rapto das contas bancárias há 20 anos, Bonifácio Andrada declarou, demonstrando ignorância de que o país viva tempos de estabilidade econômica: “Facilita ter dinheiro em casa. Aliás, o que tinha já foi embora na compra de cartazes. Agora, confesso que no Brasil de hoje é preferível ter em casa do que deixar no banco. Não se esqueça do Collor”.
# ESTADO DE MINAS
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