Empresário Sidney Oliveira, da Ultrafarma, é preso em SP em operação que investiga propina na liberação de créditos tributários
O empresário Sidney Oliveira, da Ultrafarma, foi preso em São Paulo na manhã desta terça-feira, após o Ministério Público de São Paulo (MPSP) deflagrar a Operação Ícaro, que, segundo o órgão, teve como objetivo desarticular um esquema de corrupção envolvendo auditores fiscais tributários lotados no Departamento de Fiscalização da Secretaria da Fazenda do Estado. Procurada pelo GLOBO, a defesa de Sidney Oliveira ainda não se manifestou.
Por que Sidney Oliveira foi preso?
Segundo o MP, a investigação conduzida pelo Grupo de Atuação Especial de Repressão aos Delitos Econômicos (GEDEC) identificou um grupo criminoso responsável por favorecer empresas do setor varejista em troca de vantagens indevidas.
Nesta manhã, foram cumpridos mandados de prisão temporária, entre eles o do supervisor da Diretoria de Fiscalização (DIFIS) da Secretaria da Fazenda e Planejamento do Estado de São Paulo (Sefaz-SP), Arthur Gomes da Silva Neto, apontado como principal operador do esquema, e Marcelo de Almeida Gouveia, que também atuava na pasta.
Também foram presos dois empresários de companhias beneficiadas por decisões fiscais irregulares. Um deles é o dono da Ultrafarma, o outro é Mario Otávio Gomes, diretor estatutário do grupo Fast Shop, rede especializada no comércio de eletrodomésticos e eletrônicos. De acordo com informações de seu perfil na rede Linkedin, ele é formado em administração de empresas, começou a trabalhar na empresa em 1994 e exerceu o cargo de diretor de tecnologia por 20 anos.
Procurada, a Ultrafarma ainda não retornou ao pedido do GLOBO. A Fast Shop informou que ainda não teve acesso ao conteúdo da investigação, e está colaborando com o fornecimento de informações às autoridades competentes.
De acordo com o MP, o fiscal manipulava processos administrativos para facilitar a quitação de créditos tributários às empresas. Em contrapartida, recebia pagamentos mensais de propina por meio de uma empresa registrada em nome de sua mãe. Constatou-se que o fiscal já recebeu, até o momento, mais de R$ 1 bilhão em propina.
“A operação é fruto de meses de trabalho investigativo, com análise de documentos, quebras de sigilo e interceptações autorizadas pela Justiça. Os investigados poderão responder pelos crimes de corrupção ativa e passiva, organização criminosa e lavagem de dinheiro. As diligências seguem em andamento”, informou o MPSP em nota.
Procurada, a Sefaz informou ter instaurado um procedimento administrativo para apurar a conduta do servidor envolvido e solicitou formalmente ao MPSP o compartilhamento de todas as informações pertinentes ao caso.
"A administração fazendária reitera seu compromisso com os valores éticos e justiça fiscal, repudiando qualquer ato ou conduta ilícita, comprometendo-se com a apuração de desvios eventualmente praticados, nos estritos termos da lei, promovendo uma ampla revisão de processos, protocolos e normatização relacionadas ao tema", concluiu.
No final da manhã desta segunda, promotores do Ministério Público detalharam, durante entrevista coletiva, que o esquema existia há mais de quatro anos.
— O esquema existe pelo menos desde maio de 2021, mas ainda estamos apurando se começou antes. O esquema estava funcionando plenamente. Em relação ao prejuízo causado para a Fazenda, ainda estamos calculando — disse o promotor de Justiça João Ricupero.
O Ministério Público cumpriu 19 mandados de busca e apreensão, resultando na apreensão de mais de R$ 1 milhão, dois sacos de esmeraldas, criptomoedas e documentos. A investigação, iniciada há seis meses, ainda está em andamento. Segundo o promotor de Justiça Roberto Bodini, há indícios de que outras empresas do setor varejista também possam ter participado do esquema.
As joias e a maior parte dos valores foram localizados com outro investigado, responsável por ajudar na lavagem de dinheiro do esquema, durante o cumprimento de um dos mandados de busca. Esse homem já tem antecedentes por estelionato em Mato Grosso do Sul (MS) e mandados de prisão expedidos contra ele e a esposa, que foram encontrados em Alphaville.
Outro mandado foi cumprido contra um segundo fiscal, em São Bernardo do Campo, com quem foram apreendidos US$ 10 mil, R$ 330 mil e milhões de reais em criptomoedas.
A investigação aponta que duas contadoras colaboravam com o esquema, ajudando a montar os pedidos de ressarcimento das empresas. Ambas estão sendo investigadas. Um terceiro servidor, que se aposentou em janeiro, também é suspeito de envolvimento. Ele foi alvo de busca nesta manhã.
Como funcionava o esquema
De acordo com o Ministério Público, o esquema funcionava por meio da empresa Smart Tax, registrada em nome da mãe de Neto. A empresa não tinha nenhum outro funcionário e sua sede era a residência do auditor, em Ribeirão Pires, onde foi preso nesta manhã. Até meados de 2021, a Smart Tax não apresentava qualquer atividade operacional.
No segundo semestre de 2021, a Smart Tax passou a movimentar valores elevados, recebendo dezenas de milhões de reais exclusivamente da rede varejista Fast Shop. Em 2022, os repasses dessa mesma empresa chegaram a pouco mais de R$ 60 milhões. Após a quebra do sigilo fiscal, a Receita Federal identificou que a Smart Tax recebeu da Fast Shop, em valores brutos, mais de R$ 1 bilhão.
Essas transações eram registradas por meio de emissão de notas fiscais e recolhimento de ICMS, dando aparência de legalidade aos serviços, diz Bodini.
— A mãe de um auditor fiscal, de uma idade já pouco avançada, sem a capacidade técnica para prestar qualquer tipo de assessoria tributária, sendo a proprietária de uma empresa de consultoria tributária e prestando serviços cujos honorários são milionários para grandes empresas do varejo. Essa constituição e esses recebimentos são comprovados através de emissão de notas fiscais. Essas emissões geraram recolhimento de ICMS, tudo feito, a não ser pela ilicitude do mérito, formalmente, tudo de maneira correta.
As investigações indicam que o mesmo tipo de “serviço” prestado pelo fiscal à Fast Shop também era realizado para a Ultrafarma. O esquema envolvia todas as etapas do processo de ressarcimento de créditos de ICMS: desde a coleta de notas fiscais e demais documentos necessários, passando pela elaboração e protocolo do pedido na Secretaria da Fazenda (Sefaz), até o acompanhamento e deferimento final.
De acordo com Ricupero, o fiscal detinha até mesmo o certificado digital da Ultrafarma para acessar o sistema da Sefaz e fazer os pedidos em nome da empresa. As investigações revelam que, em alguns casos, o fiscal conseguia liberar créditos muito acima do que a empresa realmente havia apurado, além de obter a aprovação de forma mais rápida do que seria possível pelo trâmite normal.
Bodini disse ainda que outras empresas do setor teriam relação com esse mesmo esquema. Ele explicou que, graças à quebra de sigilo telemático do auditor fiscal, foi possível confirmar que essas companhias também realizaram pagamentos dentro da mesma estratégia investigada.
O Globo
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