19/04/2021

QUEM SALVOU LULA? - POR J. R. CUZZO

Quem salvou Lula?

O Supremo Tribunal Federal, após anos e anos de trabalho conduzido ora em público, ora em segredo e sempre em circunstâncias tão obscuras que é melhor nem mexer com essa parte da história, acaba de conseguir o que queria desde que a casa de Lula caiu e ele acabou condenado por corrupção e lavagem de dinheiro: concluiu oficialmente, com todos os seus agravos, embargos e demais papelada, a maior obra da falsificação jamais registrada na história da Justiça brasileira.

Através dessa fraude, executada em câmera lenta e com repetidos acessos de grosseria na malversação da lei, os 11 ministros do STF transformaram em candidato à Presidência da República um réu condenado em terceira e última instância, com provas, testemunhas e confissões voluntárias, por nove juízes diferentes — e há pouco saído de quase 600 dias no xadrez.

O STF vive de suicídio em suicídio, tornando incompreensível para o público, a cada sentença, a ideia de que lei e moral devem andar juntas — não há nenhuma surpresa, portanto, em mais esse comportamento aberrante, quando se leva em conta que as suas decisões, cada vez mais, conduzem à negação permanente da justiça neste país. O que importa, agora, é que o STF ocupa abertamente o governo do Brasil — e está dizendo a todo mundo que tem, sim, um candidato próprio à Presidência da República em outubro de 2022.

Esqueçam o PT, a manada de anões que sobrevivem à custa do fundo partidário, a pasta disforme de governadores e aventureiros que querem, como sempre, montar num cavalo que os carregue para dentro da máquina estatal, sempre tão lucrativa para eles. Esses estão sempre ali, sentados à porta do chefe, na esperança de receberem uma ordem para obedecer.

Lula, agora e em 2022, não é o candidato deles. É o candidato do Supremo. Lula não é bobo, claro — não vai querer que o tratem assim, porque não é diretor da OAB, não é bispo e não é intelectual orgânico que vai em mesa-redonda de televisão debater ciência política com comunicadores sociais. Ele sabe muitíssimo bem o que é o STF, sabe perfeitamente o que povo brasileiro pensa do STF e vai dar graças a Deus se puder ir do começo ao fim da campanha eleitoral inteira sem falar as letras “S”, “T” e “F”.

Lula vai querer o STF — tão elogiado no Brasil civilizado, equilibrado, democrático, de “centro-esquerda”, “liberal” etc. etc. etc. — a 1.000 quilômetros de distância do seu palanque. Aqui não, pelo amor de Deus. Já imaginaram se Lula tivesse de atravessar o Viaduto do Chá, de ponta a ponta, com Gilmar Mendes a seu lado, sorrindo para a galera? Se for assim, ele nem sai candidato. Mas isso não vai acontecer, porque não há a menor necessidade de que aconteça.

Quem salvou Lula? Foi o STF, sim, mas o ex-presidente não precisa ficar agradecendo o tempo todo e atraindo ódio para cima de si mesmo; ele nunca foi bom, por sinal, no quesito “solidariedade”. Lula e o STF são um amor a ser vivido a distância. Ele pode não querer muito o STF, mas é ele quem o STF quer; vão arranjar rapidinho um esquema mutuamente proveitoso de convívio, e têm tudo para iniciar uma “longa amizade”, como no filme Casablanca.

A má notícia aí é para os outros, que ficaram sonhando pelo pacto STF-Lula, na crença de que isso ia provocar um terremoto no governo, e quando acordaram viram que estavam na chuva — e põe chuva nisso. A anulação das quatro ações penais contra Lula, desgraçadamente para todos eles, teve também o efeito imediato de anular cada uma das suas candidaturas.

Imaginava-se uma resposta culta, moderna e desinfetada para Jair Bolsonaro: com a decisão do Supremo viraram subitamente um grande zero. É onde estamos.

Nenhum comentário: