22/08/2023

EDITORIAL O GLOBO: SERIA RETROCESSO VOLTA DO IMPOSTO SINDICAL

Volta do imposto sindical seria um retrocesso

Projeto que ministro Luiz Marinho pretende encaminhar ao Congresso estabelece valor fora da realidade

Mesmo antes de tomar posse, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva jamais escondeu a intenção de rever a reforma trabalhista aprovada em 2017. O Ministério do Trabalho foi entregue a Luiz Marinho, que comandou o Sindicato dos Metalúrgicos do ABC como Lula e já fora ministro em mandatos anteriores. Agora, enquanto o Supremo demora a julgar se é constitucional haver uma contribuição obrigatória a sindicatos, Marinho confirma que o governo remeterá ao Congresso um projeto que, na prática, recria o imposto sindical (ainda que com outro nome).

Até 2017, cada trabalhador recolhia o equivalente a um dia de trabalho por ano para sustentar a burocracia sindical. Na reforma, a obrigatoriedade acabou. Foi um avanço, pois os sindicatos deixaram de ter uma fonte cativa de recursos sem fazer esforço e precisam se aproximar das categorias que representam. Os sindicalistas, há décadas habituados ao privilégio, tiveram de começar a justificar com seu trabalho o sustento das entidades.

Era, por sinal, exatamente o que Lula, os metalúrgicos do ABC e a CUT defendiam para acabar com os sindicatos dirigidos por “pelegos”. O imposto sindical foi foco de um sem-número de escândalos de enriquecimento ilícito. Com a reforma, a fonte das maracutaias secou. Em 2017, último ano de sua vigência, o imposto arrecadou R$ 3,6 bilhões. Com a extinção, prevê-se que neste ano a estrutura sindical receberá R$ 68 milhões dos afiliados. Não é pouco dinheiro. Se não satisfizer às necessidades, os sindicalistas poderão ampliar a arrecadação com capacidade de trabalho e poder de convencimento. Mas parece mais fácil aproveitar o governo de um ex-sindicalista para recuperar o manancial de dinheiro fácil.

A atual versão do projeto que deverá ser enviado ao Congresso em setembro estabelece o teto de 1% do salário anual do trabalhador, descontado da folha salarial. Pode parecer pouco, mas não é. “Antes, um trabalhador que ganhava R$ 3 mil mensais tinha de pagar R$ 100 ao ano”, diz o sociólogo José Pastore, da USP, estudioso do mercado de trabalho. “Com o novo teto, considerando o 13º salário, a remuneração anual pode chegar a R$ 39 mil, o que resultaria numa contribuição de R$ 390.” Mesmo que seja possível justificar a cobrança de uma taxa para arcar com o custo das negociações coletivas, o patamar sugerido pelo governo é escandalosamente alto (o quádruplo da antiga contribuição sindical).

O projeto do Ministério do Trabalho vincula a aprovação do acordo coletivo ao pagamento da nova contribuição, uma forma indireta de torná-la compulsória. Nas palavras do economista José Márcio Camargo, da PUC-Rio e da Genial Investimentos, o projeto é “péssimo” por “obrigar o trabalhador a pagar por algo que não escolheu”. Além disso, aumenta o custo de contratação, sobretudo dos menos qualificados.

Acomodadas ao modelo vigente de sindicato único por categoria, as lideranças sindicais preferem fazer pressão pela volta das contribuições compulsórias a aceitar modernizá-lo. Autorizar mais de um sindicato por categoria traria uma competição bem-vinda no uso dos recursos dos trabalhadores e melhoraria a qualidade do serviço prestado. Para alguns economistas e estudiosos, sem o monopólio cartorial, uma contribuição obrigatória poderia ser justificável. Mas, se com o monopólio ela é inaceitável, mesmo sem ele seria um abuso.

Com informações do O Globo

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