16/04/2022

ESTÃO QUERENDO VIRAR A MESA - POR J. R. GUZZO

Pelos fatos ocorridos em público, o STF dará, sim, um golpe de Estado para impedir um segundo mandato de Bolsonaro

Há um golpe de Estado em preparação neste país e neste momento, pouco a pouco e passo a passo. Não se trata do velho golpe militar de sempre, com tanque de guerra, paraquedista do Exército e pata de cavalo. Também não será dado por uma junta de generais de quepe, óculos escuros e o peito cheio de medalhas, que ocupa a central telefônica, o prédio do correio e a usina de energia elétrica. Trata-se, aqui, de um golpe em câmara lenta, a ser organizado na frente de todo mundo e executado, justamente, pelos que se apresentam ao público como os grandes defensores da democracia, do Estado de direito e do poder civil — e que, no Brasil de hoje, se sentem angustiados com a ameaça de perderem os confortos que têm. É gente que vem com uma doutrina destes nossos tempos, e talhada exatamente para a situação do Brasil de hoje. Para salvar a democracia, dizem os seus pregadores, é preciso ignorar as regras da democracia e anular, de um jeito ou de outro, os resultados da eleição presidencial que será feita em outubro próximo através do voto popular — conforme for esse resultado, é claro. Ou seja: para haver democracia, é preciso que não haja democracia.

Esse golpe está sendo montado pelos inimigos do presidente da República e tem o objetivo de impedir que ele seja reeleito para um novo mandato de quatro anos. A ideia geral é dar a vitória para o seu único adversário real na eleição, o ex-presidente Lula - ou, se isso não for possível, pelo desenrolar dos acontecimentos, então que o governo vá para qualquer outra pessoa, ou para qualquer outra coisa, desde que não seja “Ele”. Não utilizam essas palavras, é claro, mas também está claro que é exatamente isso o que estão fazendo. A operação é tocada em público. Seus principais agentes são os ministros do Supremo Tribunal Federal e do alto aparelho judiciário de Brasília. Logo em seguida vêm os políticos do Brasil velho, bichado e inimigo do progresso — dos túmulos do PSDB a José Sarney, dos que querem roubar e estão em síndrome de abstinência, dos parasitas da máquina estatal, dos fracassados que precisam voltar ao governo e afastar o risco de perderem o resto de suas carreiras. O golpe é apoiado abertamente pela maior parte da mídia — tanto os jornalistas como seus patrões. Traz consigo, ainda, o consórcio nacional formado pelos empreiteiros de obras públicas, os empresários-pirata, os ladrões em geral, as classes intelectuais, as empresas aflitas com as questões de “gênero”, raça e sustentabilidade, os artistas de novela e os banqueiros de esquerda. Para eles, de duas uma: ou é Lula, ou então é qualquer solução que não seja Jair Bolsonaro. E se, no fim de todas as contas e apesar de todos os esforços, não der certo? Aí vai ser feito tudo para impedir que ele governe o Brasil e execute os projetos que a maioria do eleitorado aprova.

Bem mais concreta é a ofensiva para socar em cima do Brasil, a qualquer custo, medidas de repressão policial contra as chamadas “fake news” nas redes sociais — na verdade, uma agressão direta à liberdade de expressão, com o objetivo declarado de censurar as mensagens de “direita” e prejudicar a campanha eleitoral de Bolsonaro. As redes são o único meio de comunicação para ele — a mídia tradicional é sua inimiga de morte desde a campanha de 2018, e continuará sendo. O que lhe sobram são as redes; é contra as redes, portanto, que se dirige a repressão. Naturalmente, vende-se a ideia do combate às “notícias falsas” como um gesto de “defesa da democracia”. É exatamente o contrário. Quem vai decidir que uma notícia é “falsa” e, portanto, deve ser punida? O ministro Alexandre de Moraes e seu inquérito perpétuo, e rigorosamente ilegal, contra as “fake news” e os “atos antidemocráticos”? A mera ideia é absurda. O ministro Ricardo Lewandowski? O Superior Tribunal Eleitoral? Aí é até pior. O STE, além de contar com a presença dos mesmos Moraes e Lewandowski, é presidido pelo ministro Edson Fachin, que anulou as quatro ações penais contra Lula — incluindo suas condenações pelos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro, em terceira e última instância, e por nove juízes diferentes.

É como se os 58 milhões de brasileiros que votaram nele em 2018 não tivessem a qualificação necessária para agir como cidadãos. Na verdade, não se vê nada de parecido na imprensa desde a campanha de Carlos Lacerda, patrono-mor da direita nacional, contra Getúlio Vargas, santo padroeiro da esquerda, na eleição presidencial de 1950. “Não pode ser candidato”, dizia Lacerda. “Se for candidato, não pode ser eleito. Se for eleito, não pode tomar posse. Se tomar posse, não pode governar”. Qual a diferença?

A chave de tudo, porém, está no Supremo. A impressão que se tem, pelos fatos ocorridos em público até agora, é que o STF dará, sim, um golpe de Estado para impedir um segundo mandato de Bolsonaro — caso chegue à conclusão que pode dar esse golpe, ou seja, se tiver certeza de que todo mundo vai baixar a cabeça se os ministros virarem a mesa. Só não dará se achar que não consegue. Não há nada de tão extraordinário assim nesse cenário. Fachin anulou todas as condenações de Lula, no que foi possivelmente o ato mais insano da história do Poder Judiciário no Brasil, porque achou, e com toda a razão, que podia fazer isso sem a oposição real de ninguém. Alexandre de Moraes acha que pode ir dobrando a aposta em seu inquérito ilegal — porque comete absurdo em cima de absurdo contra as leis em vigor no Brasil, a começar pela Constituição Federal, e ninguém, nem o Congresso, nem o próprio Judiciário, diz nada contra as suas decisões. O fato é que a respeito de Fachin, Moraes, Lewandowski e Barroso sempre se pode esperar o pior possível; pensando no conjunto da obra dos quatro, é possível que aconteça pior do que se espera.

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